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Da África do Sul para a Sopa do Cardoso

O Mundo está cheio de promessas e de falsos profetas.
Conheço a história da emigração madeirense para a África do Sul desde os anos 70 até aos nossos dias, 28 vezes visitei aquele território africano em serviço profissional e lazer. E há histórias desagradáveis.

Vivi cerca de 10 anos no país vizinho Moçambique e por diversas vezes desloquei-me ali por motivos de trabalho e férias. Fui o primeiro madeirense cabeça de lista a nível nacional a concorrer por aquele círculo migratório (resto do mundo). Não me esqueço das visitas de Alberto João Jardim à África do Sul, que nos seus discursos em casas da Madeira e Associações não se cansava de incentivar os madeirenses a se integrarem, fazerem lobby e concorrerem aos actos eleitorais.
À Madeira “são todos bem vindos mas não temos lugares para todos vocês, são 300 mil e a Ilha só tem 270 mil”, dizia.
Infelizmente as minas de ouro não são para todos: uns são empresários de sucesso outros continuaram como serviçais de carrega e descarrega do mercado de Joanesburgo. Chapa ganha, chapa gasta sem segurança social, não pensando no amanhã. Há quem viva hoje na rua à espera das “migalhas dos cachorrinhos” de mão estendida .
Depois deste “nariz de cera”, vamos narrar uma história real dos nossos dias. Um madeirense que chegou à Madeira repatriado, iludido de falsas promessas.
Naquele território residia há mais de 55 anos. Trabalhou nos melhores hotéis de Joanesburgo, como barman, e quando os nossos governantes ou delegações da Madeira iam à Feira do Rand Show todos sabiam que no bar principal do hotel havia um conterrâneo que os recebia de abraços abertos e eram obsequiados com um “drink”.

Este madeirense – vamos tratá-lo pelo pseudónimo “Said” – com a idade de 76 anos vivia num quarto num edifício do governo sul africano com uma pensão de 90 euros mensais.
O “Said” alimentou um sonho: o de regressar à terra onde nasceu. Recorreu aos serviços consulares, ao conselho das comunidades madeirenses.

Sopa do Marote


Nas últimas visitas de Albuquerque e Rui Abreu e de Cafôfo àquele território tudo ficou acertado.
Com as poucas economias o “Said” pagou parte da viagem e o restante foi com auxílio dos amigos madeirenses. Foi-lhe garantido que ia para um apartamento ou um lar.
No aeroporto do Funchal era aguardado pela segurança social e por uma funcionária da Direcção Regional das Comunidades.
Do Aeroporto Cristiano Ronaldo foi para a “Sopa do Cardoso”, provisoriamente, enquanto a Segurança Social não arranjasse uma situação definitiva.
Sentiu-se desprezado pelos poucos familiares que ainda aqui tem, os quais, ao saber que estava na “Sopa dos Pobres”, deixaram de lhe falar. O regulamento da “Sopa do Cardoso” não permite pernoita para cidadãos com mais de 75 anos. Portanto a permanência era ilegal.
O “Said” sentiu-se abandonado e cometeu a “loucura” de tentar cometer suicídio ingerindo pastilhas a mais. Foi transportado para o Hospital Dr. Nélio Mendonça, onde ficou internado, sendo transferido mais tarde para a Casa de São João de Deus, no Trapiche, onde permanece.
Conheço o “Said ” há muitos anos. Em serviço do Diário ajudou a equipa de reportagem a “desbravar terreno2 e a transportar-nos a diversas localidades nos arredores de Gauteng. Já estive no Trapiche para uma visita ao “Said”: mais conformado, bem tratado e bem alimentado, mas sem qualquer visita da Segurança Social e muito menos das Comunidades e Cooperação Externa.
Termino esta pequena crónica com uma frase que tem direitos de autor, não para mim mas para o “Said”:-“Ajudei !!! Ajudem-me…”


Rui Marote
Funchal Notícias

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