Cumpre-se uma análise das Jornadas por quem nelas participou de forma anónima e informal.
As Jornadas foram consideradas um sucesso por Sua Santidade, o Papa Francisco, que escreveu ao Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, Dom José Ornelas: “Venho por este meio renovar o meu agradecimento por todo o trabalho que tiveram para preparar e conduzir a bom porto a 37.ª Jornada Mundial da Juventude, congratulando-me pela primorosa organização demonstrada em todos e cada um dos atos de que a mesma se compôs.
Gostei de tudo o que vi e ouvi…”, pelo Presidente da República, Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, pelo Primeiro Ministro, Dr. António Costa e por muito mais gente influente, como o Presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas. Nada tenho a retirar as estas análises magnânimes e generosas da parte de todos estes líderes.
Mas há uma outra vertente da realidade que não foi mencionada nos canais da comunicação social e que é necessário por a claro. É que nenhum dos líderes mencionados acima teve que andar a pé ou de transportes públicos, muito menos de suportar o calor tórrido daquela semana em Lisboa, ou de ver o caminho barrado por agentes da PSP ou voluntários.
De facto milhão e meio de pessoas em Lisboa durante uma semana constituiu mais do que uma duplicação da população de Lisboa, o que obviamente tornou a cidade muito difícil para quem tinha que se deslocar para os diversos eventos. Só transportes públicos eram possíveis e aconselháveis. Mas quando precisávamos deles ou simplesmente não havia, vinham atrasados ou simplesmente cheios. Os passes que a Câmara ou a Carris disponibilizaram foram uma óptima ideia, o problema é os cartões não transportam pessoas, os autocarros e comboios, esses sim…
Voluntários e agentes da PSP, ás centenas pelas ruas de Lisboa, impediam os peregrinos de se movimentarem nos receintos dos eventos o que impedia que nos pudéssemos juntar aos nossos grupos. Por icompreensíveis razões, de um momento para o outro, os voluntários faziam cordões barrando-nos o caminho mais directo para nos encontrarmos com o grupo a que pertencíamos. Ninguém sabia explicar porque barravam o caminho, mas obrigavam-nos a palmilhar quilómetros naquele calor tórrido. É certamente dever dos agentes da PSP garantir segurança, inspecionar sacos e mochilas, mas cortar ruas e entradas para os eventos tornou as Jornadas inaceitavelmente dolorosas e pesadas. Os peregrinos não vinham para disparar sobre o Papa ou para se atirarem sobre ele, mas para o verem. Tão simples como isto.
A Missa final foi certamente o momento alto do sucesso publicitário pela presença de uma massa humana de milhão e meio de pessoas em condições difíceis: dormir ao relento em colchões de pedras soltas, alguns problemas – inevitáveis alguém diria – com as casas de banho e a distribuição de água, etc. O sucesso do evento foi mais a vontade indomável, especialmente dos jovens, de quererem ouvir a mensagem do Papa que se resumiu nesta simples frase: “segui os vossos sonhos e não os vossos medos” e continuai a fazer parte da Igreja, porque o futuro dela depende de vós. O escândalo da pedofilia clerical não diminuiu de forma alguma a determinação dos jovens em quererem ver o Papa mesmo que fosse de longe. Não se encontraram com ele, viram-no e alguns de bem longe…Mas foram sucesso para a economia de Lisboa, possivelmente as finanças do Vaticano que devem ter arrecadado uns milhões com os pagamentos dos jovens à organização que com o contrapartida receberam uma mochila, uma Tshirt e mais umas recordações. Opiniões houve que consideraram os pagamentos dos respectivos pacotes uma exploração inaceitável, escandalosa e imoral. Afinal eram jovens, estudantes a vastíssima maioria deles.
Felizmente que não houve desacatos, como tem acontecido desde Maio de 1968 em Paris, com as manifestações juvenis pelo mundo inteiro, onde se incendiam carros, roubam lojas, atiram pedras, ataca a polícia, destroi propriedade pública e algumas jovens mostram os seios em protesto contra o que esteja em causa. Esta falta de desordem levou um jornalista português do jornal Sol a dizer que as Jornadas foram uma desilusão. Terá certamente direito à sua opinião, ainda que disparatada.
Também se pergunta se outro líder religioso viesse a Portugal se o Governo Português e as Câmaras Municipais e o Presidente lhe dariam a mesma atenção e investiriam tanto como investiram com Sua Santidade…
Outra mancha negra das Jornadas foi a deslocação do Papa a Fátima em três helicopteros que fecharam o espaço aéreo e impediram os helicopteros de combate aos incêndios da zona, para meia hora de oração. Poderia ter rezado o terço em Lisboa evitando assim umas toneladas de gases poluentes para a atmosfera. Este gesto contradiz totalmente a ‘Laudato Sì’ , a Encíclica ecológica do Papa, onde ele pede aos jovens respeito pelo ambiente e ecologia.
Padre Carlos Gabriel
Capelão Português (Cessante) no Reino Unido.